Deu em O Globo
A julgar pelo primeiro dia de horário eleitoral dito gratuito — apenas dito, pois o contribuinte é quem paga —, eleitor interessado em saber ao certo o que pensam objetivamente os principais candidatos a presidente sobre questões concretas, e como farão para cumprir promessas, terá de esperar os debates.
Aplica-se a receita dos especialistas em marquetologia eleitoral segundo os quais o que vale é a “emoção”. Às favas com a lógica, a argumentação cartesiana e clara.
A hora é de sensibilizar o eleitorado com imagens e sons em torno de acenos que talvez não sejam efetivados, tudo a partir da projeção de uma realidade risonha, mas impraticável, por contingências da vida real —, aquela que, nestes tempos, costuma ficar em último plano. Os programas eleitorais se passam num reino da fantasia.
Se já soa artificial o resultado do trabalho de modelagem, inclusive do ponto de vista físico, em torno de Dilma Rousseff, sempre durona à frente dos ministérios de Minas e Energia e da Casa Civil, não fica atrás outro surpreendente produto das linhas de montagem de cyborgs eleitorais, o “Zé”, criado para dar tinturas de popular ao economista, ministro, parlamentar, prefeito e governador de poucos risos José Serra. É assim que a tentativa de criar o popular gera o popularesco.
Da mesma fábrica dirigida por marqueteiros tucanos surgiu em 2006 o personagem “Geraldo”, clone de Alckmin. O resultado é conhecido.
É preciso registrar que a tão ciosa legislação eleitoral, preocupada em dar condições de igualdade aos candidatos, atenta para que trucagens não sejam usadas na campanha, passa ao largo do show de efeitos especiais em que se transformou o horário eleitoral.
Desta vez, não faltou sequer uma favela cenográfica, montada no programa do tucano. Nem sobrevoos do território nacional, no estilo super-heróis, para unir o criador Lula e sua criatura Dilma, filmados nos dois extremos do país.
No final das contas, a legislação funciona mais é como instrumento de censura de programas de humor e da cobertura eleitoral de rádios e TVs.
Como a chamada “profissionalização” das campanhas transformou o político em um ator intérprete de texto alheio, muitas vezes encenando um personagem que ele não é, as eleições se convertem cada vez mais em palco à disposição de ficções.
Enquanto se trabalha para atenuar a imagem da Dilma ministra, compõe-se um jingle para o “Zé” Serra em que a candidatura tucana coloca-se ao lado de Lula, sem contestá-lo:
“Quando Lula da Silva sair/ É o Zé que eu quero lá”.
Partido de oposição precisa fazer oposição, diga-se o óbvio. Não pode ser sublegenda da situação, para tentar resolver o pleito apenas no confronto de currículos entre candidatos.
O PT, por sua vez, tenta vender a ilusória ideia do terceiro mandato de Lula, que, por sinal, avisa que terá papel ativo no governo Dilma. Será?
E enquanto a plateia é entretida por estes scripts, o país, em quatro meses e poucos dias, terá novo governo e Congresso, numa conjuntura mundial ainda incerta, mas que não repetirá sequer de longe o ciclo de bonança da Era Lula.
Tampouco haverá espaço para o Planalto continuar a acelerar gastos, como nos últimos quatro anos, pois a carga tributária já passou dos limites. O que dizem os candidatos?
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