Deu em o globo
Assim como garante a liberdade de imprensa e expressão, a Constituição sustenta o direito à reunião — prerrogativas democráticas clássicas, restabelecidas pela Carta de 1988.
O PT, portanto, faz o que a lei permite ao convocar para amanhã, em São Paulo, um ato contra o “golpismo da mídia”, ao qual haviam aderido centrais sindicais, CUT à frente, a União Nacional dos Estudantes (UNE) e os partidos aliados PCdoB, PSB e PDT.
Se não contraria qualquer dispositivo legal, a iniciativa do PT, de evidente intuito eleitoreiro, atropela os fatos, não passa de repeteco do truque manipulador usado desde o estouro do escândalo do mensalão, em 2005.
Ali começou, com tinturas acadêmicas, fermentada por intelectuais petistas, a tese do “golpismo” da imprensa independente, usada toda vez que, por dever profissional e ético, ela noticia fatos objetivos que porventura contrariem o projeto de poder lulopetista.
Foi assim também no caso dos aloprados; e agora o mesmo mecanismo volta a ser acionado na defenestração do braço direito de Dilma Rousseff na Casa Civil, Erenice Guerra, sucessora da candidata no cargo de ministra.
É desconhecer a função do jornalismo profissional imaginar que o caso de Erenice e de sua grande família não deveria ter destaque no noticiário, em nome de um equivocado tratamento equânime dos candidatos.
Como cada notícia tem peso próprio, impossível não dar destaque às acusações, com provas documentais, da existência de um ninho de lobismo montado na Casa Civil pelo filho da ministra Erenice, Israel. Os desdobramentos do escândalo falam por si sobre a proporção da história: além da ministra, exonerações na Casa Civil e nos Correios.
Mais uma vez a militância desengaveta a ideia de “golpismo” como forma de jogar areia nos olhos da sociedade, para esconder evidências difíceis de disfarçar. Uma delas é que, se tudo não passa de maquinações da imprensa, por que exonerar a confiável, fiel Erenice e os demais funcionários?
Também é preciso muito contorcionismo para dissimular a condição de obedientes correias de transmissão governista das centrais sindicais e UNE, cuja adesão tem rendido nestes quase oito anos de lulismo generosos repasses de dinheiro do contribuinte.
As centrais, tornadas entes reconhecidos pelo Estado, dentro do velho modelo varguista que Lula e a CUT tanto criticaram em outros tempos, passaram a receber parte do imposto sindical. Já a UNE perdeu o poder de crítica e de mobilização, quando aprendeu o caminho mais curto de acesso a verbas oficiais.
A encenação de amanhã é apenas mais uma prova de como o governo Lula, com o manejo de recursos públicos — verbas e vagas — , cooptou o sindicalismo, partidos e organizações outrora aguerridas.
E com isso a vida política brasileira foi amesquinhada, passou a ser um jogo de cartas marcadas, onde proliferam o fisiologismo, clientelismo e o patrimonialismo — os três “ismos” que resumem um cenário desanimador, no qual o Brasil demonstra ter dificuldades de escapar da sina nacional-populista que voltou a rondar a América Latina.
O “golpismo” é mais um efeito especial, um adereço de mão neste enredo de fins autoritários, com slogans em prol da democracia, mas cujo objetivo, ao investir contra independência da imprensa, é o oposto.
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