terça-feira, 30 de novembro de 2010

Os desafios do PT paulista

Enviado por luisnassif, ter, 30/11/2010 - 11:54

O PT traçou um diagnóstico preciso sobre a posição política da classe média paulista (veja abaixo). Havia uma herança conservadora, de Paulo Maluf, que passou para Orestes Quércia e caiu no colo do PSDB, depois de Mário Covas.

O grande desafio até 2014 será reconquistar a classe média – parte da qual já foi do PT - sem perder as classes populares.

Vamos avançar um pouco mais nessa análise.

De fato, havia uma parcela de centro-esquerda intelectualizada simpática ao PT. Esse grupo se desgarrou devido a alguns fatores-chave.

Um deles, a militância sindical na USP, muito radicalizada, que acabou desgostando a muitos intelectuais simpáticos ao PT. A Universidade ainda é grande formadora de opinião.

Outra, o episódio conhecido como "mensalão".

Finalmente, a resistência atroz a qualquer forma de sindicalismo – visão consolidada pelo trabalho diário de demonização do sindicalismo pela mídia.


A cara do PSDB

O pacto com a mídia paulista foi fundamental para a consolidação do PSDB no estado.

Numa ponta, a velha mídia com afinidade ideológica, consolidada na era Serra por uma ampliação dos negócios do Estado. Outra, a mídia radiofônica, pequenas e médias rádios, conquistadas pela ampliação vertiginosa da publicidade oficial.

Mas, por trás disso tudo, há a herança de imagem da era Mário Covas e o papel essencial desempenhado por Geraldo Alckmin. Ele é a cara do PSDB paulista, não Serra nem FHC.

Já comentei várias vezes sobre Alckmin governador. Não é gestor, pensa pequeno, não têm cabeça aberta, não tem visão estratégica, não tem critérios precisos para indicar seus secretários. Prova maior foi a escolha de João Carlos de Souza Meirelles para a Ciência e Tecnologia e, depois, sua indicação para coordenador do programa presidencial. Na última hora, tiveram que recorrer a Yoshiaki Nakano para costurar um documento de 50 páginas, porque Meirelles não conseguia sair do prefácio.

Outra, a de Arnaldo Madeira para o cargo mais importante do governo, o de Chefe da Casa Civil, substituindo Antonio Angarita. Madeira é uma cabeça burocrática, sem conhecimento de gestão, de políticas públicas e de articulação política. Colcocou a Casa Civil exclusivamente a serviço de sua reeleição. Foi responsável pela maior derrota de Alckmin – a perda da presidência da Assembleia Legislativa para Rodrigo Garcia, abrindo espaço para a ascensão de Gilberto Kassab.

Mas, do ponto de vista de partido, Alckmin é um craque, da melhor escola de Mário Covas.

O primeiro traço de sua personalidade é a lealdade partidária. A mesma que fez com que todos os líderes responsáveis do partido fossem com o Beato Salú Serra até o dilúvio, poupando-o de críticas entaladas na garganta para não implodir o partido.

Segundo, tem o sentimento do povo – no caso, a classe média paulista. É educado, discreto, faz a figura do médico de família. Sempre avalio como termômetro a escola das meninas. Dilma é odiada; Serra é tolerado; Alckmin é amado.

Contei para vocês a reação de Bibi e suas coleguinhas com a propaganda eleitoral mostrando Serra entrando em uma casa humilde, pegando a Bíblia e começando a rezar com a família. Soou falso, intrusivo, próprio de pessoas sem uma camada de verniz de educação. Alckmin jamais incorreria nessa demagogia grosseira.

Nas conversas com prefeitos do interior é possível perceber a diferença que faz um governador atencioso e educado – como Alckmin – de um casca grossa como Serra.

Além disso, mesmo limitado como gestor tem bem nítido o sentimento de responsabilidade de governante.

Em uma viagem com ele, na campanha de 2006, desabafou – numa indireta a Serra e a FHC – que jamais esqueceu a lição de Covas, de pelo menos uma vez por semana sair às ruas, misturar-se com o povo, recolher o sentimento da rua.

Esse mesmo sentido de responsabilidade se ouve em relação à sua esposa , Lu Alckmin, ao contrário de Mônica Serra que sempre se manteve ausente das ações sociais do Palácio.

Outra característica sua – que o identifica com parte da classe média paulista – é o conservadorismo entranhado. E aí se tornou um Maluf e um Serra com mais legitimidade – porque com imagem consideravelmente mais preservada do que os dois.

É conservador nos hábitos, na visão sobre segurança pública, na visão dos movimentos sociais. E tem biografia preservada, vida pessoal discreta. Enfim, tudo o que o conservador paulista queria de um governante.

O desafio do PT

Há inúmeros desafios para o PT, o maior dos quais é resolver seus próprios conflitos internos. Em São Paulo apenas Mercadante e Marta tem uma certa cara de classe média. Terá que apostar em mais quadros.

O segundo ponto é reconquistar a intelectualidade paulista, o que será possível depois do segundo turno das eleições – em que o risco Serra despertou os quadros desiludidos com o PT sobre as conquistas sociais ameaçadas. E aí o projeto Lula – a ser continuado por Dilma – é peça chave.

O grande desafio, no fundo, será a batalha da mídia – que tem nessa classe média seu último reduto.

A batalha da comunicação é que acabará decidindo essa disputa.

Do Valor

PT paulista busca classe média para se refundar

Ana Paula Grabois e Cristiane Agostine | De São Paulo
30/11/2010

Os 20 milhões de votos recebidos pela candidata do PV a presidente, Marina Silva, causaram uma mudança no discurso que o PT pretende adotar em São Paulo. Em busca de mais votos em 2012 e em 2014, o diretório paulista coloca como prioridade o tema do desenvolvimento sustentável, de acordo com documento debatido pelos dirigentes em reunião no sábado.

Por meio da exploração da questão ambiental, o partido pretende se aproximar da classe média mais resistente ao PT e dos jovens. "Ambiente e juventude têm que ser bandeiras prioritárias para o nosso partido, têm que fazer parte da nossa formulação programática", diz um trecho do texto obtido pelo Valor.

rte da direção do PT argumenta que o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi "o que mais combateu o desmatamento e o que mais se preocupou com as questões ambientais", embora o tema tenha sido identificado com a candidata do PV.

Para os petistas, a presidente eleita Dilma Rousseff terá "legitimidade" para defender o assunto. "Cabe ao PT construir uma agenda que insira como prioridade um modelo de desenvolvimento que busque a sustentabilidade. É prioridade quebrarmos o bloqueio que os setores médios têm em relação ao nosso projeto", afirmam.

Outra análise da direção do PT paulista diz respeito aos efeitos negativos do suposto envolvimento da ex-ministra da Civil Erenice Guerra em tráfico de influência. Já frustrada com o escândalo do mensalão, parte dos eleitores de classe média desistiu de Dilma por conta das denúncias e votou em Marina, nulo ou em branco.

"Os setores médios dialogam conosco, mas tendo as crises políticas de 2005 e 2006 debaixo dos braços. Quando surgiu o caso Erenice, todas as crises enfrentadas pelo nosso partido foram ressuscitadas e a oposição criou o grande fato da conjuntura política eleitoral, gerando o segundo turno da eleição nacional", afirma o documento.

A agenda proposta para as próximas eleições inclui demandas da classe média, como segurança pública, criação de emprego de qualidade para quem completou o ensino superior, trânsito e transporte público.

Tanto Dilma quanto o candidato do PT ao governo de São Paulo, Aloizio Mercadante, perderam dos concorrentes tucanos no Estado. Antes do primeiro turno, Dilma chegou a ter vantagem de cerca de 10 pontos percentuais sobre o candidato do PSDB, José Serra. A presidente eleita chegou ao fim do primeiro turno no Estado com 3,3 pontos percentuais abaixo do tucano, o equivalente a 783 mil votos a menos. No segundo turno, a distância de Serra ampliou-se: o tucano recebeu parte dos votos dados a Marina Silva e ficou com 1,85 milhão de votos a mais que a petista.

O desempenho de Mercadante foi ainda pior. Perdeu já no primeiro turno para Geraldo Alckmin (PSDB), cuja votação superou o petista em 15,4 pontos percentuais, uma diferença de 3,5 milhões de votos.

A resistência da classe média é observada em todo o país, avaliam os petistas, sobretudo nas capitais e nas cidades maiores. Trata-se de uma classe média já consolidada sem ligação com a nova classe média que explodiu no governo Lula.

"Em São Paulo, uma parte desses setores médios já se referenciou no ademarismo, no malufismo, depois no quercismo. Como o declínio desses projetos políticos, durante o governo Covas e com a ascensão do governo FHC, o PSDB fez um giro para a centro-direita e conquistou uma parte significativa desses setores médios do Estado", diz o documento.

Ao ceder território para os tucanos, o PT perdeu a simpatia de parte dessa classe média já consolidada, o que resultou na atual inversão de bases do partido. Quando fundado, o PT tinha "mais facilidade de diálogo com setores médios mais politizados e mais dificuldades com setores populares". O texto do partido, contudo, classifica como um "desafio" a manutenção do diálogo com a base popular e criação, ao mesmo tempo, de espaço para uma agenda da classe média. A legenda defende até a participação dos movimentos populares e sindical na formulação de ações voltadas aos setores médios do eleitorado.

A estratégia do partido, segundo o documento, é preparar-se às eleições municipais de 2012 com esforços na expansão da base de apoio em cidades com mais de 100 mil habitantes. Nesse plano, os petistas consideram fundamental a aliança com o PMDB no Estado, presidido pelo ex-governador Orestes Quércia, opositor ao governo federal. Com apoio do PT, o vice-presidente eleito, Michel Temer, lidera movimento governista dentro do partido e tem negociado a entrada do prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab (DEM).

O PT faz um balanço crítico sobre a demora para a definição do nome que iria disputar o governo paulista em 2010. Mercadante preferia concorrer por mais um mandato no Senado e só foi lançado em meados deste ano, depois de sofrer pressão da direção do partido e do presidente Lula. Agora, a intenção do PT é lançar as pré-candidaturas das eleições de 2012 no fim do ano que vem. O texto vai circular entre os filiados. Em fevereiro, os dirigentes devem aprovar um documento final que irá traçar a estratégia para as próximas eleições.

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